Compreender a diferença entre ganho de eficiência e inovação é um salto necessário para transformar os negócios, mas exige soltar as amarras do operacional
Por Sergio Lozinsky
“Nenhum problema pode ser resolvido pelo mesmo estágio de consciência que o criou.”
Albert Einstein
Os discursos de incentivo e pressão por inovação deram certo: dez entre dez empresas da atualidade inseriram esse tema, de alguma maneira, na estratégia e na rotina corporativa. Mas a aceitação da necessidade de inovar pode ocultar forças que, no fim, atuam contra a própria mudança. E aqui temos duas questões a resolver: até que ponto as organizações construíram um entendimento claro sobre inovação? Até onde as pessoas estão dispostas a ir para torná-la realidade?
A falta de cultura de inovação é um clássico entrave da transformação do negócio – e um problema especialmente complexo para as lideranças executivas. Podemos constatar essa correlação na primeira edição do estudo “Jornada do CIO: da realização pessoal ao sucesso do negócio”, realizada pela Lozinsky em 2019: o levantamento mostrou que administrar a pressão e urgência por inovação é hoje o maior desafio para 54% dos CIOs de algumas das maiores empresas no Brasil.
Um dos maiores gargalos da inovação e da transformação digital – as pessoas – persiste. E há algumas explicações possíveis para esse fenômeno. Uma delas é que inovar, de maneira geral, é um elemento novo dentro de qualquer organização. As empresas estão estruturadas para lidar com uma série de processos já conhecidos, mas, quando um novo foco de atenção entra em cena, as pessoas estão ocupadas demais com o dia a dia e a manutenção das atividades estabelecidas.
Na tentativa de virar essa chave e adicionar o novo ao operacional, a empresa busca ampliar a eficiência, ou melhorar os processos existentes, como via de inovação. Instala, no entanto, uma confusão de conceitos: inovar não significa fazer melhor, e sim criar modelos, produtos e serviços com valor agregado e potencial para transformar negócios. Pode levar, inclusive, a construir a proposta de valor do zero.
Quer ver um exemplo recorrente desse tipo de falsa inovação? É o caso de uma rede de lojas que precisa gerir de maneira mais inteligente a distribuição de mercadorias para todas as suas unidades, evitando falta ou excesso de estoque. Ela adota uma solução que usa de algoritmos para comprar e distribuir melhor, avaliando aspectos como público da loja e histórico de vendas. Não há nada de errado com essa estratégia. O erro é conceitual: inovação seria aproveitar os dados para desenvolver novos produtos ou canais de relacionamento, por exemplo, de acordo com a análise sobre os desejos do cliente.
Na era dos dados, a inovação, no entanto, nem sempre precisa vir deles. Há também uma avaliação mais holística, que inclui a própria visão de mercado e de futuro das lideranças da companhia. Esses líderes introduzem novos conceitos, produtos e serviços pois acreditam no potencial dessas ideias, avaliam os rumos da sociedade, as tendências de tecnologia, os custos e a proposta de valor da empresa, entre outros aspectos. Inovar exige, por isso, certa coragem, já que requer investir tempo e dinheiro em ideias que não se sabe como ou se irão vingar.
É nesse ponto em que a cultura de inovação se torna fundamental. Ela resume a capacidade da empresa de lidar com riscos e investimentos que podem ser perdidos. Esse mindset possibilita que as pessoas dediquem tempo a pensar no novo, e apresentem ideias sem juízo de valor – propostas que podem ou não ser implementadas, e tudo bem.
O papel do CIO e da TI
Inovação é uma mentalidade, como vimos, mas evidentemente envolve a expectativa sobre a aquisição de novas tecnologias, sejam digitais ou de sistemas que suportem a ideia. Por isso, a gestão de TI, e principalmente o CIO, são pressionados para trazer, no mínimo, as provocações para inovar. Não se trata de uma responsabilidade exclusiva da TI, mas o líder da área deve entender que essa expectativa existe e, portanto, considerar o assunto em sua evolução de carreira e também na de sua equipe.
Gerar interesses nas reuniões com o board não é uma tarefa técnica – ela depende da proposta de soluções de negócio para problemas que, muitas vezes, a empresa sequer sabe que tem, tamanha a sua complexidade. Assim, para atuar a favor da inovação, cabe ao CIO não só acompanhar as novas tecnologias, mas também observar o que os concorrentes estão fazendo (benchmark), participar de congressos, buscar conteúdos sobre o tema e mesmo incentivar investimentos em startups com propostas inovadoras, que ajudem a eliminar as âncoras do crescimento.
Mais uma vez, o problema aqui é humano: os CIOs sentem-se presos ao dia a dia, e assim correm o risco de transferir o papel de protagonista da inovação para áreas como vendas, recursos humanos ou marketing. Não se trata de algo necessariamente ruim, pois todas as lideranças devem compartilhar desse objetivo, mas a TI não pode ficar trás. Afinal, se a área não tiver atuação estratégica nos momentos em que a empresa coloca em discussão o próprio negócio, há duas prováveis consequências: ou o board questiona se o CIO é a pessoa certa para ocupar o cargo, ou questiona se a TI é uma área puramente técnica. E esse é um risco muito mais preocupante que o da própria inovação.
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