Planejamento sólido e bem elaborado é fundamental para atravessar momentos de incertezas ao mesmo tempo em que se prepara a retomada do crescimento dos negócios
Por Ricardo Stucchi
O plano de TI de uma empresa não pode parar – nem mesmo durante uma crise como a que vivenciamos em 2020, com a pandemia do coronavírus. Ao contrário, é fundamental que ele continue, já que pode ser determinante para a retomada dos negócios. Porém, essa continuidade não vem sem desafios, que adquirem contornos muito particulares em organizações financiadas por fundos de private equity.
Nem todas as empresas, sejam elas investidas ou não, têm um plano específico para a área de TI. Diante do cenário que se instalou a partir de março no Brasil, ficou evidente que quem não tinha como prioridade levar a empresa para uma realidade digital, mesmo que a longo prazo, precisou se planejar ou replanejar no meio da crise. E esse nem sempre é o melhor momento devido às pressões e contingências externas e internas.
Mas a crise afetou de forma diferente os diversos setores da economia. Enquanto alguns, como turismo e aviação, praticamente pararam e vão ter uma recuperação demorada e custosa, outros, como o varejo supermercadista e o e-commerce, tiveram crescimento expressivo. Recebi um depoimento recente que é um exemplo desse cenário: um empresário do mundo das bebidas me disse que sua loja já “fez o equivalente a três Natais” em vendas só neste ano. Há também um terceiro grupo: o dos negócios que conseguiram equilibrar perdas e oportunidades de modo a garantir a estabilidade, ainda que com operações modificadas.
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Nas empresas investidas, além das pressões usuais de um cenário de crise, há também as que vem, claro, do investidor. Se ele está ali é porque acredita no crescimento do negócio e tem um plano para viabilizá-lo. Em muitos casos, esse investidor entende que a crise é um momento de oportunidades que não pode ser desperdiçado. E, nessa situação, as empresas que tinham um plano de TI bem desenhado se saíram melhor, mesmo onde a tecnologia não é o core business. Isso porque nelas as lideranças já conheciam mais profundamente a área de TI, seus objetivos e metas, o que facilitou as respostas às demandas e pressões da pandemia. Muitos desses planos, inclusive, previam mudanças de longo prazo que puderam ser antecipadas, trazendo vantagem competitiva aos negócios.
Um exemplo desse movimento ocorreu em algumas academias de ginástica que contam com investidores por trás do negócio. Esse segmento foi um dos mais afetados pelas normas de distanciamento social, mas as empresas estavam habilitadas para oferecer opções que foram de aulas online até aluguel de equipamentos. Muitas das soluções só deveriam entrar em fase de implantação no médio ou longo prazo, mas a pandemia forçou sua antecipação. Essa aceleração só foi possível porque líderes e investidores entendiam que o negócio deles não se restringia às salas físicas. E porque viam a tecnologia como parte indissociável de seu core business.
Quando um fundo define a compra de uma empresa é porque entende que ela está apta para alcançar outro patamar, seja por crescimento de mercado, porque vai se juntar a outras empresas ou porque vai expandir seu market share. Um plano de TI precisa ser estabelecido porque, de variadas formas, muitas vezes todos esses objetivos dependem da TI.
No caso das empresas que atuam em setores mais atingidos pela crise, a decisão de manter o plano é mais difícil, obviamente. Porém, chamo a atenção para uma oportunidade: um dos grandes desafios em se executar projetos é gerenciar as concorrências e urgências do dia a dia. Nesse sentido, não existe melhor momento que esse para executar projetos com grande mobilização de equipes e tempo das pessoas. E mesmo a maioria dos setores mais prejudicados vai retomar suas atividades em algum momento, e voltar em outro patamar pode fazer toda a diferença frente aos concorrentes ou para o posicionamento no mercado.
Um plano de TI bem feito tem caráter estratégico, contemplando oportunidades e crescimentos que foram discutidos junto ao board e até aos investidores. Assim, portanto, tem condições de fornecer respostas rápidas à crise. Por sua vez, um plano malfeito fica preso ao wishful thinking, tem mais intenções que ações, e acaba redundando no infame perfil da TI “tiradora de pedidos”. E se o plano sequer existe, é preciso começar do zero, o que é difícil e oneroso no cenário atual.
Em nossa atuação no mercado, percebemos que os fundos de private equity têm uma atenção cada vez maior com a área de tecnologia na hora de investir. Não há mais espaço para uma visão simplista sobre o que precisa ser feito pois ela reflete diretamente no resultado. Entendemos que devem existir dois momentos de análise: um antes da compra, para mitigação de riscos, e outro logo após a compra, focado em planejamento. Mas esse é assunto para um próximo artigo.
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