Faces e fases de um CIO

“A melhor maneira de alcançar o autoconhecimento não é pela contemplação, mas pela ação” (Goethe, 1749-1832)

A evolução é inerente à vida. Conforme os anos avançam, adquirimos mais conhecimento, acumulamos experiências e assumimos maiores responsabilidades, seja no âmbito pessoal ou no profissional. Para um CIO, esse processo de amadurecimento é acompanhado de grande ansiedade, uma vez que a tecnologia segue transformando a sociedade e os modelos de negócios, estabelecendo-se como ferramenta para a criação do futuro: e do CIO se espera que tenha a clarividência de orientar a empresa na correta aplicação da tecnologia no negócio.

O conjunto de conhecimentos de domínio de um CIO tornou-se amplamente sofisticado: falamos de gerar inteligência para o negócio a partir da “mineração” dos dados, do entendimento sobre conceitos como “jornada do cliente”, de sistemas complexos para automatizar os processos da companhia, da adaptação aos novos marcos regulatórios, como  o General Data Protection Regulation, ou GDPR, entre tantos outros. Não é simples encontrar, no mercado, um profissional tão completo, com experiência, visão de negócio, liderança, conhecimento técnico e preparo psicológico para ocupar um cargo extremamente estratégico. Em geral observo, especialmente, três perfis de lideranças da área de tecnologia:

O primeiro deles é o experiente. Falo de um bom profissional, atuando há muitos anos como gestor de TI, mas que encontra alguma dificuldade em fazer a transição para o dinâmico ambiente digital – que demanda agilidade, aperfeiçoamento contínuo do conhecimento, novas experiências, etc. Embora ele entenda a TI como um componente estratégico da empresa, a sua área atua predominantemente reagindo às demandas do negócio: ou seja,  ele está, na maior parte do tempo, “correndo” para atender os novos requerimentos – alguns relacionados às novidades tecnológicas – e à necessidade de mudar constantemente, o que o faz atuar de forma nem sempre planejada ou estruturada. É provável que o seu time de profissionais, embora qualificado, não consiga ajudá-lo a responder da forma mais adequada aos desafios de negócios, em função de contemplar um perfil mais técnico, ou por conta do tempo tomado pela sustentação da arquitetura tecnológica em operação.

Depois, há o perfil do CIO descolado. Com pelo menos 12 anos de experiência na posição, tem um ótimo conhecimento sobre tecnologia e novas tendências, assim como compreende o mercado e a estratégia da empresa. Ele é percebido como um agente importante para desenvolver novos negócios, pois é provocativo e desafia os colegas de trabalho com suas concepções sobre assuntos diversos – jornada do cliente, omnichannel e  inteligência de negócios, por exemplo. Esse profissional não apenas tem assento nas reuniões executivas, mas também lidera o seu time em questões importantíssimas da TI – e das quais ninguém mais pode tomar conta. Além disso, é bem relacionado no mercado, com colegas CIOs e fornecedores de TI. E, esperto, não esquece do suporte às operações, onde uma pequena falha pode colocar a sua reputação em risco.

E há, também, um perfil que chamo de jovem. Digo isso porque eles são realmente mais novos, em média na faixa dos 30 anos, e são alçados à posição de CIO pela impetuosidade, pelas escolhas ousadas e assertivas, pelo dinamismo e pelos conhecimentos técnicos que demonstram ao longo de sua curta – porém efetiva – carreira. É inteligente, mas precisa amadurecer como gestor e líder, além de não ter ainda desenvolvido todo o domínio emocional para lidar com as exigências do cargo.

Mas seja qual for o perfil, ser um CIO é, por si só, um grande desafio. Requer energia para passar por dificuldades diárias das mais diversas naturezas, algo que nem todo mundo tem disposição para fazer. Por ser constantemente questionada, a posição implica desgaste mental e emocional. Afinal, da TI se espera inovação. Ao mesmo tempo, deve garantir a operação do dia a dia – cinco minutos sem internet, por exemplo, pode gerar uma série de questionamentos sobre a qualidade e o valor da área.

Por isso é recomendável que todo CIO, independentemente de seu momento, procure algum aconselhamento – sobre temas técnicos (segurança e arquitetura de sistemas, por exemplo), conceituais (planejamento e governança, outro exemplo) e psicológicos (como atitude e relacionamento). E, quando bem utilizado, esse conhecimento adicional enriquecerá a atuação profissional e contribuirá para a evolução favorável de sua carreira.

Ainda que à primeira vista o “descolado” pareça ser o perfil ideal para o CIO no momento, as circunstâncias de cada empresa requerem um entendimento mais profundo. Há profissionais competentes nas três categorias, e, na prática, o melhor perfil vai depender da cultura empresarial, da arquitetura de sistemas existente, e do momento de mercado da organização. O que torna a posição de líder de TI ainda mais sensível.

Justamente por ser uma posição com muitos riscos, traz também inúmeras oportunidades. É importante fazer uma reflexão pessoal para avaliar se (e como) está atendendo às imposições da sociedade digital. Cabe a cada um de nós entender: estamos conscientes de nossas capacidades e limitações? Estamos ouvindo e vendo o que se passa e compreendendo as mudanças? Estamos construindo algo que realmente agrega valor?

artigo assinado por

Sergio Lozinsky

Sócio-fundador e CEO
Com mais de 30 anos na TI, é fundador da Lozinsky Consultoria. Autor de livros e inúmeros artigos sobre estratégia empresarial e tecnologia.
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