Falar que a transformação dos negócios é um processo contínuo e necessário pode parecer óbvio, especialmente no momento em que a inovação tecnológica causa euforia e ansiedade mercados afora. O termo transformação ganhou status de condição de sobrevivência. Mas a verdade é que mudanças sempre fizeram parte de uma evolução natural – e intrinsecamente dolorida – do mundo corporativo, do indivíduo e da sociedade como um todo.
O fato é que, desde o final do século XVIII, com a Revolução Industrial, até os dias atuais, a transformação vem ganhando contornos mais complexos. Certa vez, li um artigo que comparava a evolução tecnológica e de mercado com uma espiral, em que cada volta é menor e mais rápida do que a anterior, exigindo, portanto, movimentos ágeis e precisos.
Assim são os tempos modernos: a globalização, o rápido avanço da tecnologia, a facilidade para buscar informação e a capacidade de adquirir ou fazer o que se deseja expandem nossas possibilidades. Porém, ao mesmo tempo, geram mais pressão e angústia, principalmente quando não compreendemos, claramente, o caminho para a mudança.
O processo torna-se mais doloroso quando existe um estresse em relação à capacidade de sobrevivência dos negócios. No mundo corporativo, as barreiras de entrada de um concorrente no mercado estão cada vez menores, por conta do fácil acesso ao conhecimento e ao crédito, o que exige das empresas velocidade de reação. E o grau da dor aumenta, porque, afinal, as novas tecnologias e a redistribuição de papéis e responsabilidades fazem as transformações parecerem mais radicais do que eram antes.
Adicionalmente, a mudança de médio a longo prazo briga com as exigências de curtíssimo prazo, causando uma verdadeira confusão de prioridades que, de preventivas, tornam-se emergenciais. Ao focarem apenas na necessidade da venda imediata ou na superação da crise de hoje, as pessoas adiam as questões do futuro. Não percebem que parte desses problemas emergentes indicam, justamente, que está na hora de uma transformação.
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Veja: não há como sublimar a nossa natureza. A mudança, eventualmente, vai doer. Mas, planejando uma organização de transição, é possível conviver com as demandas imediatas e as de médio e longo prazos, enquanto a transformação ocorre e ganha maturidade. Em outras palavras, a organização temporária cria perspectivas para que esse ponto de virada ocorra no momento certo, ao permitir a convivência entre o suporte às operações que não podem parar e a construção do novo modelo de negócios, com desenvolvimento de processos mais adequados, renovação do parque tecnológico, governança, definição de papéis e outros aspectos fundamentais para esse movimento. Por isso, gastar tempo e esforço para pensar e estruturar a transformação ameniza a dor.
Entre o que a empresa deseja se tornar e o que ela efetivamente é, existe um rito de passagem, que vai tomando forma à medida que a organização está mais preparada para o futuro. E quanto mais a liderança legítima da empresa apoiar e conduzir essa transformação, mais fluida ela será. Por outro lado, quando os líderes delegam a responsabilidade da reforma cedo demais, exigindo que outros escalões guiem as pessoas sem que o caminho esteja pavimentado ou mesmo entendido, todos sofrem.
É verdade que a aceitação das mudanças e a resposta a elas são batalhas coletivas, comuns a todos nós, exigindo a substituição de hábitos, a realização de novas atividades e o abandono da zona de conforto. Sabendo disso, precisamos alimentar nosso espírito empreendedor e a disposição a arriscar. Caso contrário, toda possibilidade de transformação positiva será um fardo. Alguns buscarão, provavelmente, apenas se adequar aos novos modelos de trabalho, se isso é inevitável. Outros tomarão coragem para se posicionar frente aos inúmeros desafios que surgem todos os dias.
Não há, no fim, tanto o que pensar. Afinal, no mundo corporativo, espaço não fica vazio por muito tempo.