*Por Ricardo Stucchi
“Projetos complexos” não são chamados assim por hábito: eles realmente têm aspectos desafiadores que demandam disciplina, atenção e empenho ao longo de meses. Exigem equipes multifuncionais, compostas por pessoas que talvez nunca tenham trabalhado juntas. Têm custos elevados, que podem aumentar ao longo de sua implementação se a gestão não é bem-feita. Ainda assim, as dificuldades inerentes aos projetos de TI são, recorrentemente, subestimadas, com a justificativa de que problemas acontecem porque “as coisas são assim mesmo”.
Não são. É evidente que mesmo o projeto mais bem-estruturado está sujeito a imprevistos, mas isso não justifica a mentalidade equivocada que abre espaço para que erros perfeitamente evitáveis se tornem frequentes e custosos.
A disseminação das práticas de agilidade trouxe às empresas a cultura do fail fast – ou “falhe rápido”, sugerindo aplicar uma atitude de tentar, errar e aprender com o erro. Porém, adotada de forma pouco reflexiva, essa premissa acabou se tornando um fail fest, um “festival de falhas”, quando a grande questão deveria ser fail less (“falhe menos”).
Não estou dizendo que a metodologia ágil está errada em sua premissa. Pelo contrário, ela tem bases legítimas e há situações em que ela realmente traz benefícios. No entanto, a adoção indiscriminada dessa filosofia levou a um certo relaxamento das práticas que podem dar uma base mais sólida para o desenvolvimento de projetos.
Essa é uma das razões pelas quais 70% dos projetos empresariais não atendem seus objetivos iniciais. Esse número apareceu em uma pesquisa global realizada pela plataforma Wrike em 2015, e a mesma porcentagem foi identificada em um estudo realizado em 2024, agora pela plataforma TeamStage. Ou seja: a ineficiência é disseminada e não vem de hoje – também não dá sinais de que vai parar.
O pensamento preventivo não é inato, ao contrário do que pode parecer. Anteceder-se a problemas que ainda não aconteceram não faz parte da nossa natureza, pois significa dedicar esforços para enfrentar um risco que (ainda) não se concretizou – o que seria um preciosismo, além de uma tarefa bastante aborrecida.
Nossa tendência é pensar que “se der problema, na hora a gente resolve”. Porém, a resolução frequentemente não será possível nessas circunstâncias. Ou até será, mas a um altíssimo custo, e esse, bem sabemos, é algo com o qual empresa nenhuma quer lidar.
Esse pensamento é a causa de outro grande causador do fracasso de projetos: os orçamentos irreais.
Em um projeto complexo, com tarefas mais dispendiosas e sujeitas a diferentes tipos de intempéries, a conta pode facilmente mostrar um crescimento exponencial em relação ao que foi originalmente dimensionado, por exemplo, fazendo com que o projeto seja encerrado antes de ser concluído devido ao estouro do orçamento, ou ao prazo muito maior que o inicialmente previsto.
E os possíveis fatores prejudiciais ao sucesso do projeto não se limitam às questões financeiras. A ineficiência que se tornou a norma na execução de projetos é marcada por múltiplas deficiências: o tempo de resposta esperado dos fornecedores costuma ser inviável, a complexidade dos cenários de testes é subestimada (o que leva a testes feitos de forma rápida e incompleta – isso quando são feitos), dados essenciais ao projeto são processados sem tratamento, e até mesmo os prazos para validar documentos – internamente ou junto a órgãos fiscalizadores, quando é o caso – não são factíveis.
Esses são só alguns exemplos da ineficiência que parece estar tão normalizada na realização dos grandes projetos. Falta um entendimento – mais ainda, um reconhecimento – de que as demandas são variadas e complexas, e que não se pode pensar a execução com essa crença (enganosa) que “na hora sai”. Testemunhei isso em muitos projetos dos quais participei, e em praticamente todos eles fui considerado perfeccionista quando apontei a necessidade de ajustes básicos.
Já vi casos de empresas que viviam um bom momento em seus setores, e decidiram investir em projetos que não estavam bem estruturados. Quando o mercado arrefeceu, o projeto não havia sido entregue, e a companhia não tinha recursos para tomar as medidas necessárias para encarar aquela conjuntura. Ou seja: o dinheiro foi rasgado em nome da ineficiência.
Fala-se muito em “aprender pela dor”, mas quando a dor é normalizada, o aprendizado precisa vir de outra forma.
Em vez de procurar culpados, a organização deve aproveitar essas situações para rever sua cultura, pois não existe lição mais transformadora do fazer algo da maneira correta – e ver que a postura diligente traz resultados.
A ineficiência acarreta prejuízos financeiros, compromete a credibilidade da empresa, repele profissionais competentes e consolida uma cultura onde fica cada vez mais difícil remodelar os processos pensando em eficiência. Como toda mudança, essa também precisa ser top-down, com a alta direção assumindo a responsabilidade por uma governança mais rígida e definida.
É preciso criar uma nova cultura, uma que permita dizer, parafraseando um ditado popular, que “nunca foi sorte, sempre foi método”.