Sergio Lozinsky
Realizar entregas com qualidade não é uma tarefa minimalista. Apesar disso, o discurso de “fazer mais com menos” (a conhecida pressão por resultados no curto prazo) ressoa em muitos espaços de alto comando. E tem um peso especialmente grande sobre a TI.
Faz sentido pensar em entregas maiores com recursos menores?
A resposta é sim, desde que tenhamos um entendimento claro do cenário. E, para isso, é preciso definir mais precisamente esse “mais com menos”. No caso da TI, esse conceito deve se traduzir em duas frentes: eficiência dos processos de negócios e estabelecimento de prioridades.
Eficiência dos processos implica em quase atingir a capacidade máxima instalada, seja de equipamentos, sistemas e pessoas, de modo que eles entreguem um resultado na maior escala possível, com qualidade e redução de custos. Quanto às prioridades, toda empresa se depara com uma série de temas que tendem a disputar tempo, recursos e atenção: vendas, compras, expansão, aquisições, contratação de pessoal e de serviços… Diante disso, é preciso mapear estrategicamente onde focar.
Em termos mais diretos: uma coisa é trabalhar bem, outra é saber onde esse bom trabalho deve estar concentrado.
De modo geral, executivos de grandes empresas entendem essa questão. A dificuldade se apresenta realmente na execução do conceito de acordo com a realidade de cada organização. A TI não é a única responsável por essa execução, evidentemente, mas é essencial ao processo, pois contribui com as soluções de tecnologia que permitirão implantar as mudanças. Em termos práticos, podemos dizer que a TI está fazendo mais com menos se:
Para tanto, é necessário investir na arquitetura de sistemas. Uma automação eficaz demanda software, variedade de dispositivos móveis, redes poderosas em capacidade de processamento, contingências muito bem-feitas para que o usuário nem perceba que houve um incidente. Também é preciso ter uma boa equipe de TI, dimensionada sem lacunas nem exageros, e com perfis adequados à sofisticação e à demanda do negócio.
Investir na arquitetura de sistemas implica em pensar, de forma mais abrangente, o conjunto de soluções necessárias para atingir o grau de automação e controle desejado. Isso se opõe a tratar os temas e desafios pontual e individualmente, buscando soluções “rápidas” para o que parece ser o “mais importante” ou “politicamente adequado” no momento.
Ou seja, a TI desenha um modelo futuro de arquitetura de sistemas e, a partir daí, novas demandas, problemas e mudanças no negócio são analisados pensando em como (e quando) encaixá-los no desenvolvimento dessa futura arquitetura. Essa atitude de planejamento de longo prazo – embora pareça mais “difícil” de explicar – talvez seja a maior contribuição que a TI pode dar ao negócio para fazer mais com menos.
A construção de um business case (ou ROI) das novas demandas e melhorias é algo que pode ajudar a privilegiar a visão mais ampla. Em muitos casos, ficará claro que “seguir o script” da construção da futura arquitetura ainda será mais vantajoso.
Vale a pena ressaltar que esses investimentos não são, necessariamente, sinônimos de inovação. Afinal, quando a empresa está em um grau de automação abaixo do desejável ou do possível, não é o caso de necessariamente falarmos em inovar, e sim de equiparar-se às exigências do mercado.
Por sua vez, o estabelecimento de prioridades demanda inteligência de negócios. Ou seja: além de uma arquitetura de sistemas, é preciso investir também em uma arquitetura de dados. Para tanto, a TI deve identificar, junto às áreas de negócio e lideranças da empresa, as informações que vão permitir aos gestores priorizar corretamente aquilo que pode trazer melhores resultados. Idealmente, isso deve vir acompanhado de insights, projeções e cenários do tipo “what If” (“o que aconteceria se…”).
A partir do entendimento dessas informações de inteligência, cabe à TI oferecer – a partir dos sistemas disponíveis, e ampliando e melhorando essas informações à medida que novos componentes vão sendo incorporados à arquitetura – os dados e suas correlações que permitirão ao negócio tomar decisões, estabelecer prioridades bem fundamentadas e repensar suas demandas com uma visão “mais ampla e mais longa”. Ou seja, Business Intelligence (BI ou Analytics) é um aspecto fundamental de uma TI que proporciona “mais com menos”.
O que está desenhado até aqui não é utopia, porém é preciso lembrar que o dia a dia das operações do negócio tende a sacrificar a execução do “novo”, em função do fato (verdadeiro) de que a empresa não pode parar. Portanto, enquanto a TI precisar gerir uma arquitetura “problemática”, mais tempo será necessário para “mudar as coisas”. O desenho da futura arquitetura de sistemas não é somente algo ideal, mas também o como chegar até lá levando em consideração as limitações e problemas de hoje.
A TI tem um papel fundamental de implementar soluções que vão reduzir significativamente esse gap. Zerar esse déficit pode ser uma ilusão, mas certamente é possível trabalhar com maior prevenção e melhor planejamento. E isso também é fazer mais com menos.
Outro aspecto delicado da execução é o financeiro, por isso é necessária uma governança que direcione os investimentos dentro de um ecossistema (TI + terceiros) com capacidade de execução em parâmetros aceitáveis. Porque o ROI só vai se cumprir se o projeto for executado como foi planejado – e um ROI não cumprido depõe contra o processo de automação e contra a visão mais ampla aqui defendida sobre a arquitetura.
O que costuma pôr isso a perder é a tendência de se olhar o pontual para satisfazer pedidos imediatos do negócio. “Apagar incêndios” é inevitável, mas isso não é sinônimo de eficiência. Ao contrário, nesses casos o que costuma acontecer é que as equipes fazem “menos com mais”.
Embora tenhamos concentrado o foco na importância da TI para o “mais com menos”, não posso deixar de ressaltar que essa capacidade de execução diz respeito à empresa como um todo. Afinal, todo o esforço tem como objetivo final o aprimoramento do negócio.
A TI pode – e, em alguns casos, deve – estar à frente dessa execução, já que ela fornece as ferramentas para que o processo seja replicado em toda a organização. Mas ela não deve ser percebida como “a salvação da lavoura”, muito menos como um “herói solitário”. Planejamento, governança e execução são responsabilidades de todas as áreas, e são itens que precisam estar em constante evolução, bem como a arquitetura de sistemas e a de dados. Afinal, tanto o mercado como a empresa são dinâmicos: concorrentes entram e saem de cena o tempo todo, colaboradores também – além disso, outros imprevistos acontecem.
Se o objetivo é o crescimento do negócio, não é possível acreditar em soluções permanentes ou definitivas. Por isso, o “mais com menos” é um processo contínuo, talvez até uma cultura empresarial, mas que precisa ser entendida corretamente.
Este artigo foi publicado originalmente na coluna Transformação Digital sem Travas, no portal The Shift
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