Tempos invisíveis e, em geral, subestimados na elaboração do planejamento tendem a atrapalhar a execução orçamentária prevista para o ano
Por Ricardo Stucchi
“Espere o melhor. Prepare-se para o pior. Capitalize o que vier.”
Zig Ziglar, escritor e orador motivacional norte-americano
A verba de tecnologia da informação já representa 7,7% do faturamento líquido das empresas, e aumenta percentualmente todos os anos. Os números desse estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sugerem que a TI criou vínculos com negócios de diversos setores e, se antes era vista como um custo oneroso, hoje é considerada uma alavanca do crescimento. O orçamento de TI se tornou, assim, uma ferramenta das mais importantes – ironicamente, das mais subestimadas também, inclusive pela própria gestão de TI.
Cada empresa costuma ter uma forma de calcular o seu orçamento: algumas recorrem ao histórico do ano anterior, outras usam benchmark e há aquelas que apelam para o “achismo” mesmo. A essa altura do ano, as estimativas já estão fechadas na maioria delas. O desafio passa a ser a garantia de que a previsão será, de fato, executada ao longo do próximo ano. E essa é uma tarefa complexa porque os gestores tendem a descuidar de um fator que, muitas vezes, é invisível na fase de elaboração do orçamento: o tempo.
A diferença entre orçamento e planejamento não passa despercebida. Afinal, o primeiro é uma estimativa de gastos, muitas vezes baseada em um nível de informação muito aquém do realmente necessário para a execução. Já o segundo é o que torna as empresas capazes de executar seus orçamentos com foco na transformação dos negócios – desde que considerem esses tempos invisíveis na hora de elaborá-lo.
Um bom planejamento está diretamente ligado ao conhecimento das engrenagens da empresa durante a execução dos projetos, da disponibilidade das equipes, dos tempos de contratação, da disponibilidade das lideranças e até mesmo de aspectos de Recursos Humanos, como férias e recrutamentos. É ter o domínio dessas características fundamentais que faz o planejamento, de fato, funcionar. E as respostas dependem do momento de cada empresa e precisam constar no planejamento se os gestores desejam tirar os projetos do papel. Porém, o tempo necessário para a execução de algumas atividades é, em geral, subestimado nesse processo.
Afinal, o fornecedor pode solicitar 30 dias para iniciar a implantação dos sistemas. A consultoria, outros dez para que o consultor comece a trabalhar imerso na empresa. A elaboração do contrato com o departamento jurídico também é complexa e, consequentemente, tende a demorar. Até aspectos como a disponibilidade de agendas de executivos influenciam o timing dos projetos e, consequentemente, o orçamento disponível para executá-los.
O que observo no mercado é que muitos se debruçam sobre o orçamento com afinco, mas esquecem de observar esses pequenos tempos invisíveis que, somados, podem fazer o projeto perder o seu timing. Se o orçamento de TI será executado no início do ano fiscal, por exemplo, significa que, no final do anterior, o detalhamento das ações deve estar pronto, incluindo não só os custos, mas também o tempo de contratação das tecnologias, a alocação e o engajamento de pessoal, possíveis contratações (de consultoria, mão de obra, software por assinatura) e por aí vai.
O erro mais comum é fazer uma previsão orçamentária sem levar em consideração que há prazos para que os projetos comecem a andar. Assim, criam-se duas possíveis situações: a primeira é que o gasto previsto para um determinado mês pode ocorrer meses depois do planejado, o que cria a falsa sensação de economia quando, na verdade, os projetos estão travados.
A segunda consequência é ainda mais preocupante: os pagamentos são feitos conforme a estimativa orçamentária, ainda que os projetos não andem. E aí a TI reforça a sua fama de centro de custos, quando precisa justamente combater essa crença e assumir o papel estratégico que lhe cabe nos negócios.
Portanto, a liderança de TI deve assumir para si o orçamento, que não pode ficar só na mão do CFO. É preciso fazer o planejamento, prever o timing de cada etapa e acompanhar a execução dos projetos para garantir que aquilo que foi colocado no papel está, de fato, acontecendo na vida real.
Além disso, deve ficar alerta: planejar também não é garantia de que tudo sairá exatamente como foi estimado. É muito comum a empresa ter de ajustar o caixa ou rediscutir o orçamento, já que projetos que demandariam 10% do orçamento podem, facilmente, passar a demandar 15%, por exemplo. Nesse ponto, a gestão do portfólio de projetos e o monitoramento contínuo dos números favorece a adequação, além de uma mentalidade ágil para incorporar o novo cenário sem gastar tempo demais. Se errou na estimativa de um dos projetos para mais, o ajuste é feito com aquele que errou para menos e segue o jogo.
Em outras palavras, o orçamento não é da TI só na hora de defendê-lo. E essa conduta será cada vez mais valorizada pelas empresas.
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