*Por Ricardo Stucchi
O cronista Paulo Mendes Campos escreveu certa vez que “infância é quando a gente acha que a vida é de graça”. Vejo um comportamento semelhante em muitas empresas brasileiras na relação com a TI: todo mundo reclama da tecnologia, mas poucos estão dispostos a lidar com o seu desafio e enorme complexidade. O eventual descontentamento dos usuários, a pressão por eficiência e a cobrança por inovação são condições há muito tempo incorporadas à atividade dos líderes e dos profissionais da área, e recai sobre o CIO, sozinho, a responsabilidade de resolver o problema.
Só que cuidar da tecnologia da informação custa – e não custa pouco, pois não estamos falando apenas de hardware ou software. A gestão da TI é tão custosa quanto os equipamentos e as aplicações dos quais ela se utiliza e, como em quase tudo na vida, optar pelo mais barato costuma resultar em sensível perda de qualidade.
Essa contradição parece ter se agravado nos últimos dois anos. Há grandes empresas destinando investimentos pífios para suas áreas de tecnologia, que muitas vezes são incompatíveis com condições para se fazer o essencial. Algumas faturam bilhões, mas têm destinado percentuais ínfimos do seu orçamento para a TI, o que geralmente é insuficiente para garantir as operações básicas com qualidade adequada. A situação piora quando se coloca na balança as altas expectativas que recaem sobre a área.
Vamos ponderar por um instante: pode ser que a empresa realmente não consiga destinar uma quantia razoável para a TI na previsão orçamentária daquele ano. Talvez seja um período, de fato, apertado. No entanto, se esse é o cenário, as expectativas devem ser alinhadas:
Ninguém deve esperar por uma refeição de alta gastronomia quando está pagando o valor de um prato feito. Você sabe que haverá uma perda de qualidade, mas não estará, necessariamente, escolhendo uma opção ruim. É apenas a mais adequada ao seu momento atual.
O que se espera do CIO e sua equipe é que eles modernizem suas soluções, ampliem os canais digitais da organização, confiram mais agilidade aos processos e alavanquem o negócio como um todo. Mas quando é apresentada a conta desse pedido, ninguém quer pagá-la. E, quando tais objetivos não são atendidos, a responsabilidade recai sobre a TI.
Não estou dizendo aqui que o mais caro é sinônimo de melhor. Sequer é o caso de dizer que a empresa só terá suas necessidades atendidas se tiver o best of breed. Às vezes, ela nem precisa de algo tão superior. O problema é quando o parâmetro de referência de preço é o low cost, mas o resultado esperado é o da melhor qualidade.
A opção pelo mais barato evidentemente se reflete na contratação de fornecedores. Muitas vezes, é onde vemos mais claramente as consequências desastrosas da visão limitada (e nada científica) da gestão. Abandonar um fornecedor eficiente por um de menor custo, que não atende de forma suficiente as necessidades do negócio, vai gerar perda de qualidade e de agilidade. Com isso, a equipe interna também será prejudicada em eficiência e custos, tendo que trabalhar muito mais para compensar as deficiências do parceiro mal escolhido.
A arquitetura de TI precisa ser adequada ao presente e, ao mesmo tempo, suficientemente robusta para poder se sustentar em um período de médio ou até longo prazo sem que sejam necessárias grandes renovações. Recorrendo novamente a uma analogia cotidiana: é como garantir uma infraestrutura sólida e de qualidade para sua casa, evitando que você tenha que quebrar paredes para reparar a parte hidráulica um ou dois anos depois de tê-la instalado.
Quando a visão se limita ao dinheiro, qualquer solução apresentada será percebida como cara. Isso é um erro de gestão e contraria uma premissa que ninguém tem coragem de contestar: a TI é estratégica. Mas, então, por que não é tratada, muitas vezes, como tal?
A verdade é que hoje não é de bom tom dizer que a TI não é importante para o negócio. Afirmar tal coisa passa a impressão (justificada) de que a mentalidade da organização é obsoleta.
Mas se a liderança não está disposta muitas vezes nem a levar o tema de tecnologia para uma pauta executiva, então é o caso de reconhecer que a percepção da TI como estratégica não se solidificou na cultura empresarial brasileira.
O cenário hoje já é inexoravelmente complexo: temos o aumento crescente dos custos, os altos valores inerentes à tecnologia, a desvalorização cambial, a competitividade mais acirrada, entre outros fatores. São tempos de margens de lucro mais apertadas, de revisões constantes do planejamento estratégico e, evidentemente, a TI está a par disso tudo.
Por outro lado, não é razoável esperar resultados de onde não há investimentos. A “economia” que se faz ao designar verbas insuficientes para projetos e ações de TI atende mais à manutenção de metas que, muitas vezes, são artificiais. Objetivos definidos mais a partir do bônus desejado do que de uma análise criteriosa do cenário que a empresa tem diante dela.
Para que a tecnologia da informação realmente desempenhe seu papel estratégico, é necessário um verdadeiro compromisso por parte das lideranças, indo além do discurso. Isso inclui investimento adequado, alinhamento claro de expectativas e envolvimento da TI nas decisões estratégicas.
Enquanto o foco permanecer apenas na economia de custo, a oportunidade de inovação e transformação será perdida.