2021 se inicia sem quaisquer garantias, a não ser a de que será um ano com desafios complexos e exigirá o melhor uso dos recursos já disponíveis. Porém, é possível estabelecer pontos de apoio e encontrar oportunidades de crescimento (ou ao menos de sobrevivência), desde que os líderes deem especial atenção a aspectos cruciais da empresa
A pandemia e a instabilidade política têm formado uma combinação densa que atenta contra qualquer previsibilidade no cenário econômico. Desenvolver uma estratégia de negócios tornou-se ainda mais complexo do que em qualquer outro período da história recente.
As intempéries de 2020 mostraram que não existem garantias contra o imponderável, mas que é possível falar em uma “rede de segurança”. Para construí-la, o primeiro pré-requisito é ter caixa disponível, já que o imponderável quase sempre implica investimentos não previstos e na redução das margens de lucro. O segundo passo é aprender a vislumbrar o pior. O que isso quer dizer?
De tempos em tempos, é preciso olhar para o plano que foi construído e pensar: e se, após um ano, tudo isso der errado? Quais fatores poderiam causar esse fracasso? É célebre o exemplo de Pierre Wack, o executivo francês que liderou a Shell por anos e que instituiu o planejamento de cenários na Administração. Wack havia estimulado sua equipe a imaginar colapsos no mercado de combustíveis e energia e, em um desses exercícios, eles discutiram as ações necessárias caso houvesse uma crise no petróleo. Quando ela efetivamente aconteceu, em 1973, eles estavam preparados.
Só os executivos que têm visão de longo prazo conseguem pensar nos cenários desfavoráveis prováveis e desenvolver as estratégias e dimensionar os recursos para enfrentá-los. De uma nova greve dos caminhoneiros a um golpe de estado, tudo tem que ser discutido. Mesmo que o cenário, ao fim, não se concretize, a equipe já levantou ideias que certamente serão úteis.
Perguntas necessárias
Para além desse fator insondável, há questões bastante concretas que já se apresentam neste 2021; algumas, inclusive, já se evidenciavam no ano passado. Dessas, talvez a que mereça maior atenção seja a jornada do cliente.
Em muitos segmentos, a experiência e as necessidades do cliente mudaram. O líder precisa parar e se aprofundar em todo o processo: desde o momento em que o cliente pensa em ir atrás daquele produto ou serviço até o pós-venda. Junto com isso, precisa examinar atentamente toda a cadeia de negócios em que a empresa está inserida e se perguntar qual é o papel que ela desempenha ali. É preciso enxergar todos os elos dessa cadeia e identificar os pontos fracos, analisar a necessidade de verticalizar um elo (adquiri-lo para fortalecê-lo) e, se for o caso, reconhecer que a própria empresa pode ser o problema da cadeia — só assim será possível corrigir os erros.
Depois desse olhar panorâmico, baseado na profunda compreensão da jornada do cliente, o gestor pode, enfim, pensar em digitalização. Apesar de termos ouvido essa expressão à exaustão em 2020, o tema ainda é polêmico, demanda cautela e muita inteligência. A solução para o desafio da digitalização passa por conseguir responder a duas perguntas: como posso tornar o que faço mais rápido, mais automático, mais confiável? E o que eu tenho que criar em termos de produtos e serviços digitais? Ou seja, são dois movimentos: um mais interno, de trazer o digital para o negócio, e o outro mais externo, de incorporá-lo na oferta.
Quatro pontos-chave
Há, ainda, quatro pontos a serem trabalhados pelo CEO se a intenção é criar um ambiente com algum nível de certezas. São eles: tecnologia, pessoas, processos e governança. No primeiro, nos deparamos com empresas que tiveram baixo investimento em TI e hoje enfrentam problemas em segurança, desempenho e outros aspectos operacionais.
O segundo ponto passa, basicamente, pela qualidade da equipe, o que pressupõe bons profissionais especialmente nos níveis de gestão e coordenação; são eles os responsáveis por tocar o dia a dia da empresa. Nessa posição, o CEO precisa de pessoas inteligentes e capazes de antecipar problemas. Há uma espécie de corolário desses dois que é a eficiência em si, atingida por meio de processos bem desenhados — justamente o terceiro ponto.
O quarto aspecto é a governança, que diz respeito a como as decisões são tomadas a partir das prioridades estabelecidas. É hora de revê-la, para encontrar equilíbrio entre o que é crítico e deve ser mais centralizado e o que pode ser delegado às áreas de negócios.
O cenário atual não comporta otimismo, mas (ainda) não é de terra arrasada. É um ano complexo, que vai exigir que as lideranças corporativas cumpram seu papel com o uso máximo de suas habilidades, combinando um bom planejamento estratégico com a capacidade de responder rapidamente a desafios imediatos.
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