Sobre sobrevivência, longevidade e inovação

Dados da pesquisa “Antes da TI, a Estratégia” mostram que ainda há um longo caminho para se combinar a realização dos objetivos imediatos e a continuidade dos negócios no futuro

Antes de a Microsoft se tornar a gigante que é, Bill Gates deu um recado ao time: “só teremos sucesso se nós mesmos destruirmos os nossos melhores produtos”. Há décadas, o fundador de uma das maiores empresas de tecnologia do mundo ensinava o princípio básico da cultura da inovação, conceito sobre o qual, ainda hoje, temos tanto a aprender.

Os dados da pesquisa “Antes da TI a Estratégia” ajudam a compreender esse momento. Mais de 50% das mil maiores empresas brasileiras diz efetuar melhorias constantes em relação aos processos de inovação, mas ainda observar baixo impacto em processos e no negócio. Esse número nos sugere que mais da metade das grandes organizações do Brasil acredita inovar. O conceito torna-se, assim, maleável, pois muitas companhias entendem a inovação como pequenas melhorias que geram economia, eficiência e rapidez. É fato que esses resultados deixam o board feliz, mas eles permeiam um patamar mediano, aquém do potencial.

A cultura de inovação está calcada no princípio de que, independentemente do grau de sucesso do negócio, é preciso questionar todos os seus aspectos – os serviços e produtos oferecidos, a forma de execução e entrega, o grau de automação, o modelo de relacionamento com os clientes e, inclusive, a própria visão da companhia, para garantir que ela continue fazendo sentido. Tudo é questionável dentro dessa mentalidade e, por isso, ela tem um caráter multidisciplinar, que permita a leitura de todo o contexto. O objetivo é a perenidade, que virá a partir da criação de um mercado – um oceano azul no qual a companhia navegará sozinha por um tempo, até que outros entrantes, se é que eles existirão, comecem a incomodá-la.

A realidade, porém, é que a maioria das empresas, especialmente as maiores, são voltadas ao curto prazo. Independentemente das grandes ideias e dos grandes planos, é preciso entregar, hoje, o resultado – que segue atrelado não somente aos bônus e às promoções, mas ao atendimento às demandas do acionista e à manutenção do emprego do executivo. Nesse cenário, o sentido da inovação a médio e longo prazo desaparece, ou fica em um plano inferior.

Veja: o posicionamento mais comercial, que prefere fazer o mesmo a inovar para preservar o presente, é um objetivo válido, não vamos nos esquecer disso. Mas, no final das contas, representa apenas um resultado financeiro. E por que eu digo “apenas”? Em termos de perenidade e o que a empresa representa na sociedade, esse é um compromisso raso, de baixo impacto e incapaz de construir um legado. Muitas vezes, negócios não dão certo porque o objetivo comercial e financeiro é incompatível com o que a empresa precisa fazer para crescer e competir.

No meio disso, o executivo oscila da frustração –  por ver um diamante bruto e não ter a liberdade de lapidá-lo – à indiferença – já que seu trabalho é entregar o que os acionistas querem. Diferentemente de uma visão de fundador, que deseja que a empresa sobreviva a ele e, por isso, está disposto a correr riscos e sacrifícios.

A pesquisa “Antes da TI” mostra ainda que apenas 2% das empresas se dizem resistentes a mudanças, na avaliação do CIO, mas é preciso saber interpretar os dados. A resistência ainda se mantém como item número um quando questionamos os mesmos executivos em relação aos principais riscos internos para implementação de uma nova estratégia ou mudança. Ainda que a empresa apoie a inovação.

Parece uma contradição, não é mesmo?

Os resultados indicam a postura mais conservadora dos executivos: “não sou fechado, mas não estou aqui para aceitar qualquer loucura”. Além disso, a verdade é que as pessoas são favoráveis à ideia da transformação, desde que não mude o que elas fazem. O que elas estão dispostas a fazer? Essa é a origem da incoerência entre uma resposta e outra. A inovação se define mais como uma intenção – legítima – do que uma realidade prática, o que revela um grau de dificuldade para inovar maior do que o declarado.

Enquanto o consenso for de que pequenas melhorias são suficientes para convencer acionistas que os negócios estão sendo transformados, pode ser que dê certo assim. Os empregos e os bônus seguirão preservados – ao menos, claro, enquanto essas empresas puderem sobreviver.

artigo assinado por

Sergio Lozinsky

Sócio-fundador e CEO
Com mais de 30 anos na TI, é fundador da Lozinsky Consultoria. Autor de livros e inúmeros artigos sobre estratégia empresarial e tecnologia.
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